O início de 2023 deverá ser agitado para os departamentos de recursos humanos e jurídico das empresas. A partir do dia 16 de janeiro, terão que passar a inserir no sistema do eSocial informações de praticamente todas as condenações definitivas na Justiça do Trabalho, além de acordos firmados com ex-empregados.
O eSocial impôs às empresas o dever de prestar informações, quase em tempo real, sobre obrigações fiscais, previdenciárias e trabalhistas. Com as mudanças, segundo especialistas, a União passará a ter um mapeamento completo dos pagamentos de FGTS e contribuições previdenciárias decorrentes de acordos e condenações na Justiça do Trabalho. E abrirão à Receita Federal a possibilidade de questionar valores e, eventualmente, autuar empresas.
De acordo com as regras do manual da nova versão do eSocial (Versão S-1.1), as empresas deverão registrar casos – ações e acordos celebrados nas Comissões de Conciliação Prévia (CCP) e nos Núcleos Intersindicais (Ninter) – concluídos a partir do dia 1º de janeiro de 2023.
Serão solicitados dados não só dos processos ajuizados diretamente contra a empresa, mas também daqueles em que for condenada de forma solidária ou subsidiária – como tomadora de serviço terceirizado.
Entre as informações exigidas estão o período em que o funcionário trabalhou na empresa, remuneração mensal, pedidos do processo e o que diz a condenação, além da base de cálculo do FGTS e da contribuição previdenciária. Esses dados devem ser incluídos até o 15º dia do mês subsequente à decisão ou acordo homologado.
Se na decisão não houver definição do valor da condenação, o que é muito comum na Justiça do Trabalho, a empresa poderá esperar pelos cálculos na fase de execução (cobrança) para incluir essas informações no eSocial.
Apesar do prazo estar próximo, muitas empresas ainda não estão atentas às alterações, de acordo com o advogado Cleber Venditti, sócio da área trabalhista do Mattos Filho. Quem não cumprir as determinações, alerta, estará sujeito a uma multa, que pode chegar a R$ 42.564 e dobrar em caso de reincidência.
O prazo imposto, destaca a advogada Marcela Ortega, do Machado Meyer, pode ficar bem curto a depender do dia em que a decisão transitar em julgado. Se o processo for finalizado no dia 1º do mês, a empresa terá até o dia 15 do próximo período para inserir as informações no eSocial. Mas se a ação for encerrada no fim do mês, no dia 30, por exemplo, o prazo também será o dia 15.
“Serão 15 dias para incluir os dados no sistema. Por isso, o jurídico interno e externo e o departamento de recursos humanos terão que estar muito bem conectados. As informações terão que fluir de forma rápida”, diz a advogada, acrescentando que praticamente todas as condenações e acordos terão que ser incluídos.
São todas as condenações que tratam de vínculo empregatício ou que tenham pagamento de contribuições previdenciárias. “É muito difícil ter uma ação que não tenha o deferimento de verbas que gerem cálculo de INSS e FGTS”, afirma Marcela. “Pedidos clássicos como horas extras, 13º salário e adicional noturno geram.”
Essas informações, diz o advogado Cleber Venditti, poderão ser de grande valia ao governo. “Nunca foram organizadas [essas informações]. A Receita federal é intimada nos processos, mas outros órgãos de fiscalização não”, diz ele, acrescentando que, agora, a União terá uma visão geral dos processos trabalhistas e condenações e poderá, por intermédio da Receita, questionar os valores pagos de tributos.
Ele cita como exemplo um caso de reconhecimento de vínculo de emprego de um trabalhador que recebia R$ 10 mil por mês como pessoa jurídica e ficou um ano na empresa. Na condenação, a empresa terá que pagar contribuições previdenciárias sobre 13º salário, férias e outras verbas. Mas a Receita Federal poderia questionar o pagamento sobre esses valores mensais recebidos, uma vez que ele foi reconhecido como empregado.
“A longo prazo, pode gerar impacto na arrecadação”, afirma Venditti. De acordo com ele, o Ministério Público do Trabalho (MPT) também poderia solicitar informações constantes no eSocial para embasar ou direcionar suas fiscalizações.
Já se sabia, diz a advogada Leticia Ribeiro, sócia do escritório Trench Rossi Watanabe, que em algum momento esses dados seriam solicitados. “Porém, as empresas não estão ainda muito atentas a essa nova obrigação”, afirma.
Além das informações que deverão constar no eSocial, os valores previstos nos processos e acordos ao INSS também passarão a ser pagos pelo sistema, segundo Beatriz Neves, gerente de Conformidade Legal de Produtos da ADP, empresa de soluções em recursos humanos, que atuou no projeto-piloto do eSocial.
Hoje, o departamento jurídico, depois de uma decisão transitada em julgado, deve gerar a Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações à Previdência Social (GFIP) e recolher a contribuição previdenciária. “Agora as empresas terão cerca de um mês para adequar seus fluxos e decidir quem vai fazer essa transmissão [RH ou jurídico]. Ou se vão centralizar essas informações em uma equipe mista”, diz Beatriz.
Para o ano que vem, afirma, estão previstas outras alterações no eSocial, como a inclusão do pagamento do Imposto de Renda (IR) descontado da folha de pagamentos. A previsão, para essa mudança, é maio. E no segundo semestre, acrescenta, entra o recolhimento do FGTS por meio do sistema.
O Ministério do Trabalho informa, por meio de nota, que “a implantação beneficiará os empregadores, reduzindo o tempo despendido na declaração das informações de processos judiciais trabalhistas. Vai evitar, por exemplo, que o empregador reabra e reprocesse as folhas de pagamento relativas a várias competências apenas para incluir diferenças salariais de um trabalhador”.
Também por nota, a Receita Federal afirma que “este aperfeiçoamento no envio das informações referentes a processos trabalhistas, bem como a integração com a DCTFweb, resultará em maior segurança e controle de todo o processo, tendo como consequência, melhoria na qualidade das informações prestadas e maior garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores”.
Fonte: Valor Econômico